Ir embora pode ser uma decisão difícil. Mas, nem sempre significa romper. Em muitos casos, sair da cidade natal é um movimento de expansão – e não de corte. É assim para jovens que crescem em cidades do interior, como Três Rios e Paraíba do Sul, e decidem trilhar novos caminhos em centros urbanos maiores, como Juiz de Fora. Histórias que possuem em comum a busca por mais estrutura, novas oportunidades e crescimento pessoal. Sempre com um pé (ou os dois) ainda firmes nas raízes.
Com apenas 70 quilômetros de distância, Três Rios e Juiz de Fora são municípios de diferentes estados que estão separados por aproximadamente 50 minutos em um percurso pela BR-040. A primeira, com pouco mais de 82 mil habitantes, é considerada o centro mais desenvolvido da Região Centro-Sul Fluminense. A segunda, com mais de meio milhão de moradores, é uma das maiores cidades de Minas Gerais. Os números mostram o contraste: Juiz de Fora tem quase sete vezes a população de Três Rios e receitas brutas superiores a R$ 2,7 bilhões, segundo o IBGE. No entanto, Três Rios apresenta um PIB per capita mais elevado, o que revela potencial econômico e certa autonomia regional.
É nesse cenário de conexões e contrastes que surgem histórias como a de Ana Clara Simões Monnerat, 22 anos, estudante do 5º período de Medicina em Juiz de Fora. Natural de Três Rios, a jovem guarda com carinho as lembranças da cidade onde cresceu. “Pensar em Três Rios é sentir um pouquinho de saudade. Tenho familiares na cidade”, conta, acrescentando que seus maiores afetos estão nas memórias mais simples: “São momentos na Praça São Sebastião, principalmente. Ali eu vivi não só minha infância, mas minha adolescência com meus amigos, meus pais, nos feriados…”.
Mesmo estudando fora, a conexão com a cidade natal permanece viva. “Eu me sinto muito pertencente a Três Rios e me identifico com a cidade. Costumo voltar todos os finais de semana e acredito que isso fortaleça ainda mais minha relação com as pessoas e com a cidade”, afirma. Para ela, estar em casa é estar “no meu pedacinho no mundo, meu refúgio, minha paz”.
A escolha por Juiz de Fora aconteceu naturalmente. A proximidade geográfica, a estrutura da cidade e o suporte familiar foram determinantes. “Juiz de Fora oferece um campo maior para prática e ampliação do conhecimento em medicina e, como já morava com minha irmã e tinha apoio da família, foi uma escolha tranquila”, explica.
Apesar dos benefícios da nova rotina, Ana Clara já tem um plano para o futuro: voltar. “Me imagino futuramente seguindo os caminhos dos meus pais, trabalhando com eles na clínica e podendo promover uma melhor qualidade de vida para a população”, diz com convicção. Para ela, Três Rios oferece oportunidades importantes na área da saúde. “Os benefícios superam os desafios. Em cidades menores, conseguimos aplicar uma medicina mais voltada à prevenção e à continuidade do cuidado, com mais proximidade do paciente e da sua família”.


Quem também trilhou o caminho foi Vitória de Souza Guimarães, empresária natural de Paraíba do Sul que vive e empreende em Juiz de Fora. A ligação com a cidade natal, no entanto, ela garante que continua forte. “Toda a minha família mora em Paraíba do Sul, o que faz com que eu nunca perca o vínculo com a cidade e nem é algo que eu queira [risos]. Paraíba do Sul é calmaria, aconchego. É como aquela sensação de que tudo está no lugar”, descreve.
Mesmo atuando em Juiz de Fora, Vitória mantém o atendimento a clientes da região e vê, na própria origem, uma parte fundamental do jeito de se comunicar. “Como vim de cidade pequena, sempre foi comum conhecer todo mundo e criar laços com facilidade. Replicar isso em Juiz de Fora me permitiu criar conexões verdadeiras em pouco tempo”, analisa. A decisão de empreender em Minas foi uma junção de fatores. “Sempre tive um carinho muito grande pela cidade. Quando percebi que tudo estava se alinhando para me mudar, abrir meu negócio e criar novas conexões, foi muito mais do que uma realização profissional. Foi a concretização de um desejo do coração”, confessa.
O crescimento não apagou os laços com o que ficou para trás, mas os fortaleceram. “Sair em busca de crescimento não significa cortar raízes. Pelo contrário, muitas vezes é justamente o vínculo com a cidade natal que fortalece a coragem de expandir”, diz Vitória, que pensa em fazer o movimento inverso e tem planos profissionais para a cidade de origem.
De acordo com o sociólogo Nathan Agostinho, o fluxo constante entre cidades do interior e centros urbanos maiores é parte de um fenômeno contemporâneo chamado êxodo intrarregional. “A estrutura e a dinâmica dos complexos de educação do Rio de Janeiro e Juiz de Fora convertem-se em fatores diretamente ligados à migração, o que impacta o desenvolvimento local e gera o que chamamos de ‘fuga de cérebros’”, explica.
Ao mesmo tempo, Nathan também observa uma mudança em curso. “Três Rios e a Região Centro-Sul Fluminense têm se convertido rapidamente em uma área com transformações na economia e na educação, com universidades e cursos que permitem atenuar as perdas populacionais e ampliar possibilidades de desenvolvimento local”, analisa.
O movimento de transformação pode ser sentido e observado, inclusive, no próprio trajeto que liga a região à cidade mineira. Saindo de Três Rios em direção a Juiz de Fora pela BR-040, observa-se curvas em sucessão, novas paisagens, mudanças de ritmo e até de clima. Muitas vezes, o clima quente e seco do Centro-Sul Fluminense dá lugar a uma brisa mais fresca. O clima mineiro acolhe, mas quando os olhos alcançam as avenidas Itamar Franco e Barão do Rio Branco, não há dúvidas: trata-se de uma cidade grande, pulsante e cheia de possibilidades.
Há quem diga, com razão, que Juiz de Fora é quase Rio de Janeiro e que Três Rios é quase Minas Gerais. As fronteiras oficiais existem, mas os sotaques se misturam, os costumes se entrelaçam e os caminhos são cruzados todos os dias. Entre o silêncio de uma praça e o burburinho da cidade grande; entre o afeto de casa e os desafios do novo; milhares de histórias foram e são escritas entre idas e voltas, com o sentimento de pertencimento sempre vivo.