Imagine percorrer os corredores de uma universidade por 15 anos com baldes e panos, e então, um dia, caminhar pelos mesmos lugares com um caderno nas mãos, pronta para estudar. Essa é a virada de vida de Cláudia Dias da Silva. Aos 50 anos, ela trocou o uniforme de faxineira pelo status de estudante na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), a mesma instituição onde por tanto tempo zelou pela limpeza.
“Agora, no lugar onde eu limpava, eu me sento para estudar. Deixo a Cláudia empregada doméstica e me torno a Cláudia acadêmica. É uma virada de vida. Estar aqui como estudante é uma vitória. Olho para trás e vejo que valeu a pena esperar. Nunca é tarde para aprender”, disse Cláudia, refletindo sobre sua emocionante jornada.
Um Sonho Que Parecia Distante
Aluna do curso de Ciências Humanas desde o ano passado, Cláudia marca a história de sua família como a primeira, tanto do lado materno quanto paterno, a ingressar no ensino superior. Uma conquista que para ela, muitas vezes, parecia inatingível.
“Sou negra, pobre e trabalhadora doméstica. Às vezes, o sonho está tão fora da gente, parece que nunca vai acontecer. Vivi uma vida e agora estou mudando o jogo para outra”, afirmou ela, que já havia deixado o trabalho de faxineira na UFJF antes de sua aprovação.
A Luta Pela Educação
A paixão pelos livros e cadernos começou na infância, mas a vida impôs desafios. Aos 11 anos, a perda do pai a fez largar os estudos para ajudar a mãe e cuidar dos irmãos. Aos 17, uma nova chance apareceu, mas o ensino fundamental permaneceu incompleto.
“Eu era apaixonada por estudar, mas precisei parar. O destino me forçou a adiar esse sonho”, lembra Cláudia. O casamento, os filhos e o trabalho preencheram as décadas seguintes, e a escola foi adiada por 30 anos.
O Reencontro e a Inspiração
O caminho de volta aos estudos se abriu aos 47 anos. Cláudia, então empregada doméstica, encontrou inspiração nos filhos. Luiz Maurício, atleta olímpico, e sua filha, que também havia pausado os estudos, motivaram-na a retomar o próprio sonho.
“Quis ser exemplo para ela. Voltar era um sonho meu, mas também um compromisso de mãe”, revelou. Primeiro, ela concluiu o 9º ano. Depois, ingressou no EJA (Ensino de Jovens e Adultos) do Colégio de Aplicação João XXIII, estudando lado a lado com a filha.
“Eu tinha muito medo, porque foram mais de 30 anos sem entrar numa sala de aula. O que me confortou foi a cartilha: todos aprendemos com o mesmo material, e ali me senti acolhida”, contou. Mãe e filha celebraram juntas a conclusão do ensino médio. Em seguida, Cláudia prestou o Enem e garantiu sua vaga na UFJF.
“Ter o ensino médio completo já era algo magnífico, uma grande realização. Não conseguia imaginar que um dia fosse conseguir ir além desse feito”, completou emocionada.
Olhando para o Futuro
Conciliando trabalho, faculdade, filhos, netos e marido, Cláudia segue firme. Seu objetivo vai além do diploma: é pavimentar novos caminhos. “Sinto que posso caminhar com as minhas próprias pernas. Fui com coragem, cara e vontade. Todo dia é diferente e bom. O que eu aprendo, levo pra dentro de casa”.
Seus planos futuros incluem a docência. “Gostaria de ser professora, mas preciso do pé no chão primeiro para isso, meu foco é formar por enquanto. Quero fazer o mestrado e vivenciar tudo também. Todas as portas que forem abrindo quero entrar”.
E finaliza com uma mensagem inspiradora: “A gente devia lutar mais pela educação, que é essencial para o ser humano. A vida não se conclui aos 50 anos”.